quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

O sucesso em Portugal

Há tempos, visito e “devoro” o site Brinca Brincando, dedicado a atrações televisivas que marcaram Portugal do final da década de 70 até os anos 90. João Costa e Nuno Sobral, responsáveis pelo conteúdo, rememoram desenhos, programas, séries e, especialmente, novelas, portuguesas e brasileiras. Com um visual bacana, textos muito bem elaborados, e imagens de arquivo agregadas a preciosas informações, João e Nuno transformaram o Brinca Brincando num dos melhores sites sobre história da TV. Por este motivo, convidei ambos para desenvolverem o texto que vocês irão conferir abaixo, sobre o sucesso de Pedra Sobre Pedra em terras portuguesas. Obrigado pela participação, meninos! Espero poder contar com vocês sempre!


Pedra Sobre Pedra

Exibição:
16/11/1992 – 23/07/1993 (RTP 1)

A estreia de Pedra sobre Pedra, anunciada com quase um ano de antecedência, foi rodeada de grande expectativa. Desde 1977 que as novelas brasileiras ocupavam um lugar cativo na programação dos dois canais da RTP e, mesmo após a implementação de produções nacionais, continuaram tendo índices de audiência muito significativos. Tudo começou com Gabriela, um sucesso de dimensões inéditas que não só parava o país, como influenciava o horário das votações da própria Assembleia da República. Seguiram-se O Casarão e O Astro, bem como Escrava Isaura, que inaugurou um novo horário. Até à estreia de Pedra sobre Pedra, com exclusão das minisséries, já tinham passado 54 telenovelas brasileiras (46 da Globo, 6 da Manchete e 2 da Bandeirantes), com destaque para Água Viva, Pai Herói, O Bem-amado, Guerra dos Sexos, Vereda Tropical, Roque Santeiro, Sassaricando, Vale Tudo e Tieta. Aquando da estreia de Pedra sobre Pedra no Brasil, as principais atrações da RTP eram Rainha da Sucata e Pantanal.

A atriz Laura Soveral, em Duas Vidas (Globo, 1977).
Não era esta a primeira vez que atores portugueses entravam para o elenco fixo de uma produção brasileira do género. Já tínhamos visto em O Casarão a consagrada Laura Soveral, que veio a atuar ainda em Duas Vidas, de Janete Clair. É também conhecido o trabalho de Tony Correia (O Casarão e Locomotivas), de Sinde Filipe no remake de António Maria e, embora não se fale muito, Irene Cruz e João Lourenço já tinham participado em Os Deuses estão Mortos, de Lauro César Muniz, na TV Record em 1971. Desta vez, porém, a RTP ia contribuir para a produção em cerca de 15%, ganhando uma quota nos lucros e nas exportações.

Ao longo de 1991, a direção da televisão pública portuguesa anunciou o projeto desta co-produção, a telenovela Garimpo, depois chamada de Resplendor e que no final desse ano já seria conhecida pelo seu título definitivo: Pedra sobre Pedra. Sabia-se que seria escrita por Aguinaldo Silva, o mesmo autor da popularíssima Tieta, acabada de passar na RTP 1.

Na imprensa portuguesa, foram feitas várias reportagens sobre as primeiras cenas com Carlos Daniel e Suzana Borges, gravadas em Linhares, no distrito da Guarda, e a TV Guia chegou a entrevistar de forma muito rápida a senhora que encarnou fugazmente a avó de Ernesto e Inês, uma natural da aldeia onde decorreram as filmagens.

Também foi dado destaque às cenas externas gravadas em Lisboa no final da novela, em junho de 1992, onde assistimos à despedida da protagonista Pilar Batista.

A data da estreia foi rodeada de grande mistério. Havia o dilema entre lançar a novela quando ainda estivesse em exibição no Brasil ou adiá-la para novembro, inserindo-a na grelha de programação de outono, altura em que são anunciadas as grandes atrações. Por outro lado, estava agendada para outubro a chegada da SIC, nova emissora de televisão e sócia da Rede Globo, que, neste quesito, faria uma forte concorrência à RTP. Assim, se Pedra sobre Pedra começou por ser anunciada para junho de 1992, em substituição de Rainha da Sucata (o maior sucesso de audiências daquela época), a verdade é que acabou por se converter no trunfo para destronar a concorrência, e ficou guardada para substituir Meu Bem, Meu Mal, apesar de ter sido publicada na revista TV Guia, para despistar, a notícia de que ainda seria precedida de O Dono do Mundo.

Cristiana Oliveira como Paloma, em cena de De Corpo e Alma,
na sua exibição na SIC.
Em outubro de 1992, o lançamento de Pedra sobre Pedra deu início a uma estratégia inédita até então. Lima Duarte e Nívea Maria vieram a Portugal promover a novela, sendo convidados para diversos programas. Sabia-se que a SIC, entretanto inaugurada no dia 6 desse mês, ia estrear De Corpo e Alma a qualquer momento e que faria pressão para, no futuro, ter preferência na escolha das novelas. Segundo estava previsto, Meu Bem, Meu Mal acabaria no dia 03/11/1992, na RTP 1, e Pedra sobre Pedra iria suceder-lhe no dia 04/11/1992, uma quarta-feira. Não se sabe se a informação vazou da SIC ou da RTP, o certo é que às 20 horas e 40 minutos da segunda-feira dia 02/11/1992, ambas as estações, para se anteciparem, anunciaram para esse mesmo dia a estreia das suas novelas e, assim, Pedra sobre Pedra e De Corpo e Alma começaram quase em simultâneo. Ou seja, na semana de 02 a 06 de novembro, a novela Meu bem, Meu Mal foi exibida em doses mais curtas, seguindo-se o capítulo do dia de Pedra sobre Pedra. Barriga de Aluguel, que ia ao ar na RTP 2 após o termo de Meu Bem, Meu Mal, mudou de horário durante essa mesma semana e foi ao ar às 23 horas, evitando-se deste modo a concorrência da novela do segundo canal.

Pedra sobre Pedra acabou por ser vista na versão original com 179 capítulos e não na versão internacional, de 140 capítulos de 50 minutos, sendo uma exceção em face das novelas que eram veiculadas por aqui desde 1989, altura em que passámos a ver as produções da Globo em formatos para exportação. A audiência dos primeiros meses superou a que Meu Bem, Meu Mal tinha registado no seu início, e esmagou a concorrência, pelo que a SIC optou por mudar, ao fim de pouco tempo, o horário de De Corpo e Alma para meia hora mais cedo.

Pedra sobre Pedra também marca o fim da hegemonia da RTP sobre as audiências. Nunca mais nenhuma novela registaria um índice tão elevado porque, a pouco e pouco, o público migrou para a SIC, que, no ano de 1994, ficou com o exclusivo das novelas da Globo, passando a mostrar, para além das novas produções, os antigos sucessos, outrora vistos na RTP, mas em versões mais reduzidas.

Todavia, uma vez que tinha contribuído para a produção de Pedra sobre Pedra, a RTP teve esta novela na sua disponibilidade durante bastante tempo, pelo que não foram poucas as vezes em que a mesma voltou ao ar, sempre com boa recepção. Assim, em 1996, Pedra sobre Pedra apareceu de novo na RTP 1, primeiro às 18 e depois às 19 horas, fazendo alguma concorrência à reprise de Renascer e à inédita Quem é Você. Em 1999, foi a vez da RTP África apresentar a novela, também ao fim da tarde, com um horário alternativo às 9 da manhã. Por fim, em 2001, Pedra sobre Pedra voltou à RTP 1, com exibição à hora do almoço.

por Nuno Sobral
colaboração de João Costa
imagens Brinca Brincando e João Costa

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